19 de dezembro de 2004

Cadência

Ameaça do saber mundano. Inconformidade da noite, leve, rente, foragida. O pensamento divaga ao ouvido, livre por fim da procura. Divaga pela pura fantasia, às escuras, paulatinamente na verdade do infinito. Em surdina... pela busca da ínfima, doce, musical inspiração. Tacteando o sopro, o seu curso. Tudo está calmo. Suaves toques de piano, de timbre espiritual soam a choros, a movimento, a poesia e a proximidade. As vírgulas encaixam, peregrinas, as letras caiem no papel, uma a uma, sem mão alguma, por si, sozinhas, acompanhadas somente pela harmonia dos sons do apelo, ritmadas pelo impulso do cravar das palavras na superfície do Absoluto; e repetem-se; como se chorassem. A ameaça deixa de ser força. Passam-se alguns segundos, instantes, melodias que principiam um novo choro, o começo. E o pensamento, às apalpadelas, seguro na prática da inocência, frágil na sua insipiência, conduzido pelo génio, profetisa o seu desígnio. Conhece uma nova era, sente-a nas palmas das mãos, num polvilho de experiência extrema. Ouve-se o segredar da declamação, a consumir, a fazer parte do curso do sopro, a celebrar a perfeição, a entregar-se ao enleio que chora a excelência; o escrever. Agora, corpúsculo lânguido, ainda matéria, ainda intervalo entre letras, segue por fim o canto e dissipa-se na clarividência do excelso. Lê: “A ressorção do cosmos ultimará a reintegração da unidade do infinito no perfeito”.

3 comentários:

mfc disse...

Mesmo quando tudo parece estático, a máquina do pensamento prossegue o seu caminho.

BlueShell disse...

Gostei deste texto...dá que pensar. Li-o várias vezes para o saborear. Jinho, BShell

mfc disse...

Um grande Natal na companhia de todos e obrigado por tudo.
Para a semana cá nos encontramos.