humor nosso de cada dia

Há dias em que sabe bem sair de casa e arriscar ir ao São Jorge ver comédia.

Mas há dias em que o inevitável acontece. Somos surpreendidos.

O humor assume-se em stand-up comedy em vários registos. Há o humor violento, negro, em que as pessoas saem da sala e os mais sensíveis se incomodam, guardam as palmas, se ofendem, se insurgem, processam. Em que os olhares se franzem e as piadas são de tal maneira agressivas que só podemos pensar que quem as conta só pode vestir a máscara e ter de facto um bom coração. É o humor que provoca reacções, discussões e conversa pós espectáculo.

Há o humor divertido, em que as piadas são fáceis sem serem necessariamente vulgares, as nossas mães são troçadas, as mulheres são postas à prova e os risos saem naturalmente.

Há o humor surpreendente do norte que não se senta descansado no brejeiro e tem de facto de graça, o humor que é espontâneo, ingénuo e que enternece.

E depois, há o humor de Salvador Martinha, o humor nosso de cada dia.

Foram 15 minutos em que um público inteiro se rendeu a coincidências, a reconhecimentos, a piadas de tal maneira parecidas com a nossa vida que envergonham de tanta graça que têm.

Para mim, este é o humor verdadeiro, o humor que se passa na rua, nas nossas casas, nas nossas vidas.

A vida tem graça. É assim que nos sentimos depois de ouvir Salvador Martinha, a vida pode de facto ter graça e basta-se a si mesma para criar verdadeiros momentos de gargalhada. Sem ser preciso pouco mais do que duas ou três observações sobre a forma como interagimos, como nos relacionamos, como vivemos uns com os outros.

É aquele tipo de graça que nos faz ver as manias, os tiques e os feitios de maneira diferente, os vícios, as pancadas ou mesmo e só, a nossa graça interior.

Esta temporada do São Jorge Comedy Club acabou. É com muita vontade que espero que regresse em breve e que faça rir de novo e até às lágrimas uma plateia inteira.


foto: Ana Cruz
www.apcruz.com