(Ela contou-me):
Já dei por mim a chorar sem saber porquê…
Agarrada com todas as forças (…), sentada na sala, no chão da casa de banho, bebendo água na ânsia de deixar fugir a ansiedade inexplicável que me por vezes me persegue.
Já dei por mim a acordar triste.
Já dei por mim a adormecer mais do que triste, infeliz. Já dei por mim com o medo mais aterrador de ser abandonada, e sempre com a sensação de que mais cedo ou mais tarde o seria, de facto.
Sempre tentei exorcizar estes pensamentos e tentar acima de tudo compreendê-los, mas cada vez mais me apercebo de que não irei nunca encontrar a razão, a explicação, mas sim a confirmação de que fazem parte de mim…
Não se escolhe como se nasce, como se cresce, mas procura-se entender e conhecer e descobrir. Porque é que sou assim? E nada me ajuda. Sigo uma enormidade de filósofos, que me atribuem mais uma característica, de não escolher apenas uma filosofia mas sim identificar-me com várias, e o meio faz a pessoa, a experiência oferece o conhecimento, a genética atribui-nos características. E eu encontro-me no meio de teorias e explicações que decifram tudo menos os porquês básicos da vida. Quem sou eu? O que faço aqui? Qual o meu destino? Qual a minha razão?
E onde está o grande filósofo que responde às questões primárias e que todo o ser minimamente consciente de si mesmo tenta e quer e precisa conceber?
E se somos nós os grandes filósofos de cada vida, de cada ser. Talvez eu seja a minha filosofia e encontre grandes teorias que expliquem o porquê de mim? Se me entender, se me explicar poderei então considerar-me filósofo e filosofia à minha vida? Onde está O ser humano que alguma vez se compreendeu? Como pode a filosofia compreender a vida e sua essência se nenhum Homem se compreende a si mesmo e aos outros?
Não apreendo a vida, como me posso me posso reconhecer?
Já dei por mim encostada aos pensamentos mais desumanos, humilhando-me, rebaixando-me, considerando-me pouco. E no entanto, um dia depois, após uma hora, sei que tudo irá ser como dantes, que o espelho me dirá coisas boas, que o amor me ama, que o ódio não me conhece, que o meu coração é bom, que os dos outros mo confirmam.
A mente sabe ser obscura e tão incrivelmente triste e é tão fácil não gostar de nós e sentirmo-nos tão “ratos”.
Já fui “rato” tantas vezes. E adio o pensamento e sinto angustia e raiva e dor, e não quero sofrer nem acreditar que sou realmente diferente ou pior ou até melhor.
E o adiar de sentimentos é fatal. Sentir e ignorar. Ignorar e esquecer. Fingir que se esquece, que já passou, é passageiro, imediato e breve.
Amanhã estarei melhor, serei diferente, mais forte. Mentira! Tanta mentira! E os filósofos que nos concebem a mente, não explicam porque é que a vontade não supera a genética, e a força não supera a sensibilidade. E eu não me supero a mim mesma…
Tentei crescer uma pessoa forte, cheia de confiança, cheia de destinos imaginários, projectos, desafios. Dei por mim diferente, não pior, simplesmente diferente, com os mesmos desafios, com a mesma ou maior ambição, mas espantosamente com uma força diferente. Uma força que não sobrevive sozinha. A minha força não se aguenta de pé sem ajuda.
A minha força é fraca…
(para ela continuar)